Pedro
Sob a Cama (Idem, Brasil, 2017)
Dir:
Paulo Pons
Numa
cena rápida no início do filme, o protagonista Mariano (Fernando Alves Pinto)
está buscando emprego como executor de serviços gerais e o empregador lhe pergunta:
“você é bom em consertar coisas?”. Esta é, em escala maior, a grande provação
de Mariano: tentar desfazer os equívocos e desastres que o destino lhe pôs no
caminho, ou pelo menos recolar as coisas sobre os trilhos. Há oito anos um
desentendimento numa festa acabou vitimando a esposa dele, grávida. Agora ele
tenta reatar os laços com a família que havia ficado para trás.
A criança que a mulher carregava na barriga é Pedro, esse do título que se refugia
sob a cama. Ele sobreviveu, mas nasceu com a sequela da mudez. O pai nunca o conheceu
porque depois da tragédia Mariano desapareceu da vida de todos, inclusive do filho
que a esposa tinha de outro relacionamento anterior, o agora adolescente Mani (Konstantinos
Sarris). Quando Pedro descobre sobre o retorno do pai, que nunca viu, desvenda a casa
para onde ele se muda e sorrateiramente passa a “invadi-la” e se refugia,
silenciosamente, debaixo da cama do homem sem que ele perceba.
É
claro que o retorno de Mariano reabre cicatrizes do passado e revira de ponta
cabeça o emocional de todos. A tentativa de reaproximação de Mariano esbarra na
agressividade de Mani, nessa fase difícil de mudanças que é a adolescência, e
na mudez de Pedro, que faz o tipo do garoto esperto e introspectivo, daqueles
observadores, atento ao que se passa ao redor sem chamar muita atenção para si – ele costuma se comunicar com os outros através de um celular preso ao pescoço onde digita mensagens. Parte
do filme nos chega a partir do seu olhar um tanto quanto neutro diante da
situação.
O
diretor Paulo Pons esforça-se para manter uma pegada intimista e aquela doçura
que tem o cuidado de não esbarrar no drama rasgado. Porém, o filme escorrega quando precisa amarrar as
pontas do roteiro que soam inverossímeis em tantos momentos, capazes de tirar o
espectador desse clima que o filme vai construindo.
Outros
personagens e situações soam caricatas, como o comportamento da cunhada de
Mariano no início do filme, ou a atitude da avó (vivida por Betty Faria) que
tenta impedir o contato de Mariano com os netos – o que rende uma cena
deplorável com os “capangas” da avó surgindo do nada numa praça e “prendendo”
Mariano antes dele conseguir se aproximar do filho pequeno. E há ainda o grande
mistério de como Mariano nunca percebeu uma criança dormindo debaixo de sua
cama em tantas noites.
Tais
deslizes de roteiro, entretanto, poderiam ser relevados se não fossem
constantes. E se não se somasse a isso a necessidade de uma direção mais segura
– câmera na mão mal usada é o que mais incomoda –, ainda que o tom do filme
mantenha-se acertadamente no campo da melancolia. É como se o tempo todo houvesse
um esforço para fazer o filme engatar e encontrar a firmeza da condução, via
intimismo, mas somente poucas vezes ele alcança esse lugar com propriedade – a cena
da conversa entre Mariano e Mani na porta de casa, por exemplo, é bem boa nesse sentido.
Aliás,
os atores que interpretam esses dois personagens são os que se saem melhor em
cena. Fernando Alves Pinto segura em si grande parte da dor enraizada e da
dificuldade de expurgar as culpas que esse homem carrega, fazendo aqui um
bonito paralelo com o personagem que ele mesmo interpretou em Para Minha Amada Morta, de Aly Muritiba.
Enquanto isso, o jovem Konstantinos faz de Mani um garoto sempre prestes a explodir,
o que sacode o filme, inclusive por ele partir para cima de um comumente pacato
Mariano, injetando gás em certos momentos que poderiam ser mais numerosos. Falta
esse fôlego maior a Pedro Sob a Cama e uma
mão mais firme de direção.
Nenhum comentário:
Postar um comentário