Ninguém
Está Olhando (Nadie
nos Mira, Argentina/EUA/Espanha/ Brasil/Colômbia, 2017)
Dir:
Julia Solomonoff
Julia
Solomonoff já trouxe para o Cine Ceará seu trabalho anterior, El Último Verano de la Boyita, filme
vencedor da edição de 2010. Agora ela retorna com Ninguém Está Olhando e perfaz uma bela mudança de ares. Abandona o cenário campestre do interior da Argentina e agora ruma para uma paisagem cosmopolita fora do país de origem, aportando na terra de oportunidades que é
Nova York.
Ela
abandona também um lugar comum de certo cinema latino que investiga, via
naturalismo, mais uma história de coming-of-age
para ser mais original no novo filme: acompanha as desventuras de um jovem ator
argentino que tenta carreira nos Estados Unidos. Nico (Guillermo Pfening) fazia
uma novela de sucesso em Buenos Aires, mas por motivos pessoais, que envolvem
um relacionamento mal resolvido com seu produtor, decidiu tentar a sorte longe
dali.
Sem
muito dinheiro e pagando aluguel em apartamento compartilhado com outras
pessoas, sua primeira fonte de renda é trabalhando como baby sitter, inicialmente dos filhos de amigas que tem na cidade americana, além de bicos como garçom e afins. É a vida quase cotidiana de um
imigrante latino, ainda em volta com burocracias legais e visto de permanência
a expirar.
Importante
saber também que a própria diretora mora atualmente em Nova York, e o filme não
deixa de refletir os desafios que ela mesma enfrentou, passando pelas observações
e convivência com outros latinos, artistas ou não, a partir de uma comunidade
que se integra ali.
Ninguém Está
Olhando
busca desnudar certo mercado e ambiente da indústria audiovisual, que no país
americano ganha outros níveis de concorrência, agressividade e exigência –
Nico, por exemplo, loiro de olhos claros, enquadra-se mais num biótipo europeu do
que latino, algo que a indústria já estereotipou há algum tempo. Mas no fundo,
o filme é também uma história de pertencimento uma vez que Nico parece o tempo
todo desconfortável com as pequenas batalhas que empreende em busca de realização profissional, sempre à espera de uma oportunidade que alavanque sua
carreira, mas que demoram a vingar. Viver ali parece um calvário, um lugar que
se lhe mostra pouco acolhedor, e o filme é marcado por um tom melancólico que passa
pela expressão cansada de Guillermo Pfening sem apelar para exageros
dramáticos.
Em
certa medida, o filme gira muito ao redor dos mesmos dilemas e dificuldades de
sempre enfrentadas por ele, o que torna a narrativa um tanto redundante e que patina
pelos mesmos conflitos. No geral, a direção de Solomonoff exprime competência e
dita ritmo ao filme, muito também pela gama de outros personagens que circundam
a vida de Nico. A visita inesperada de um amigo argentino, também ator, com
quem Nico trabalhava na televisão portenha, gera bons momentos que potencializam
o desconforto do protagonista, tendo de fingir estar e viver bem para não ter
de demonstrar fracasso.
Em
contraponto a esse tom derrotista que paira sobre a rotina de Nico, o filme tem
a delicadeza de pontuar os enlaces afetivos – como as conversas via skype com a mãe, vivida pela sempre
ótima Mirella Pascual – e também amorosos. Mesmo se relacionando com outros homens
em Nova York e depois de terminar um relacionamento promissor, Nico não
consegue esquecer o affair que deixou
na Argentina e que continua a assombrá-lo e persegui-lo.
Ninguém está
Olhando
possui a qualidade dos bons dramas sobre gente quebrada: o traço da
melancolia, sem passar a mão na cabeça dos seus personagens e ser
condescendente para satisfazer os ditames do final feliz, mas também sem pesar
a mão sobre eles, reservando-lhes carinho e dignidade.
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