sexta-feira, 5 de agosto de 2011

CineFuturo 2011 – Parte I

Depois de passada a correria do Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual, volto ao blog depois de um tempo parado para repassar, com mais calma, o que vi durante o evento. Começo com aquele que era um dos filmes mais esperados.


O Homem que Não Dormia (Idem, Brasil, 2011)
Dir: Edgard Navarro


Apesar de ter uma carreira bem consolidada de curtas e médias-metragens, de onde se destaca Superoutro (até então seu melhor trabalho, um grito inteligente de anarquia), o baiano Edgard Navarro ganhou maior visibilidade ao sair com as mãos cheias de prêmios (seis, no total) do Festival de Brasília de 2005 para o seu bem acabado Eu Me Lembro, estreia do diretor no longa-metragem. Justo por isso, seu próximo trabalho, O Homem que Não Dormia, trazia boas expectativas, que acabou frustrando muita gente.

Parece até que a distinção dos prêmios subiu à cabeça do realizador que, para seu novo projeto, não se preocupou tanto com o foco de sua narrativa, embarcando numa espécie de egotrip que gerou uma história confusa e sem liga, apesar das várias boas ideias espalhadas. O mais interessante é descobrir que a história acompanhava Navarro há mais de trinta anos, para só agora ganhar forma.

Numa cidade do interior baiano, cinco pessoas vivem atormentadas por um mesmo pesadelo que não os deixa dormir, envolvendo um barão, um tesouro escondido e trovões. Quando um peregrino (Luiz Paulino dos Santos) chega à cidade, as pessoas o reconhecem como o personagem do sonho.

Dito assim, parece tudo no seu lugar. Mas Navarro embaralha as histórias dos personagens, apresentando-os a partir de certos estereótipos (o padre sem fé, a mulher de vida livre, a esposa infiel do coronel, o louco torturado, o epilético), e os flashs da “lenda” do barão que traiu seus companheiros para ficar com um tesouro e acabou amaldiçoado a peregrinar pelo mundo eternamente. Na mesma medida em que muita coisa fica sem explicação (e isso nem é o grande problema), há uma despreocupação em contextualizar a história e a trajetória dos personagens, tornando tudo muito solto no filme.

Existe ainda uma atmosfera que se quer anárquica porque é explícita. O diretor faz questão de dar destaque ao nu, com closes das genitálias de seus atores, numa tentativa infantil de “chocar”, mas que peca por ser bastante forçada e sem propósito. Em Eu Me Lembro, por exemplo, o nu existe, mas é apresentado com muito mais naturalidade dentro da narrativa porque se justifica, dentre outras coisas, pelas novas descobertas de um personagem. Talvez esse seja um ranço do qual Navarro não consegue fugir.

Por outro lado, é interessante notar como a marca visual do cineasta, bastante evidente em Eu Me Lembro, retorna aqui na textura limpa e clara da fotografia. A constituição do ambiente interiorano também é dos mais felizes.

É um filme para se rever, com certeza. Mas as diatribes de Navarro, dessa vez, parecem gratuitas e pouco estimulantes. De provocação por provocação, o cinema já está cheio, e a produção brasileira precisa menos de invenções e mais de consciência criativa. Vontade e vigor, Navarro parece ter de sobra, basta aliar isso a sensatez. Que ele durma bem para pensar no próximo projeto.

3 comentários:

ANTONIO NAHUD disse...

Ótima crítica, Rafa.

Amanda Aouad disse...

Pois é, Rafael, está tudo ali, mas ele não conseguiu nos contar de uma forma orgânica. Podia ser um filme muito melhor, mas tem seu valor. E concordo que SuperOutro é a obra-prima do diretor.

bjs

Rafael Carvalho disse...

Obrigado, Antonio. Quando tiver visto o filme, volte para dizer o que achou.

Amanda, falta muita organicidade mesmo. Foi uma grande decepção, na verdade.