quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Curtinhas

Gigante (Idem, Uruguai/Argentina/Espanha/Alemanha, 2009)
Dir: Adrián Biniez


Ao mesmo tempo que o título “Gigante” simboliza o tamanho corporal do protagonista (vivido por Horacio Camandule), funciona também como grande contraponto ao fator minimalismo que é uma constante em todo o filme. Jara é um vigia noturno de supermercado que se apaixona por uma das faxineiras através das câmeras de segurança que ele acompanha pela madrugada. Solitário, de rotina vazia, poucas palavras e amigos, Jara tem uma grande dificuldade em se aproximar de sua pretendente e prefere vigiá-la fora e dentro do supermercado, como um voyeur. Somos testemunhas de sua timidez aguda.

É por isso que são poucos os diálogos no filme e é bastante importante como roteiro e direção são eficientes em expressar os sentimentos e sensações de Jara se apoiando muito na força das imagens, com grande economia. Daí surgem ótimos momentos como quando Jara usa o batom da moça (a única forma dele se sentir mais perto da boca dela). Horacio Camandule confere enorme consistência a seu personagem, um sofredor apaixonado, e o reveste de complexidade, usando muito de sua expressão. É o tipo de filme em que pouco é bastante, e o mínimo se torna muito.


Vocês, os Vivos (Du Levande, Suécia/Alemanha/Dinamarca/ França/Noruega, 2007)
Dir: Roy Andersson


Esse é de fato o filme mais esquisito e inusitado do ano que eu tenha visto. O sueco Roy Anderson se utiliza de diversas pequenas sketches, com vários personagens avulsos que se cruzam vez por outra, para falar daquelas péssimas situações que nos pegam desprevenidos. O filme tenta lembrar a todo o momento a incrível capacidade do ser humano em passar por momentos os mais tristes, deprimentes, complicados, tortuosos e tenebrosos, sempre através de um bom humor negro incrível.

Ao mesmo tempo, o diretor tem um controle tão grande da composição de quadros, filmados sempre com câmera estática, que é um primor de construção. A direção de arte ajuda bastante com um trabalho de minimalismo e faz questão de apresentar os ambientes sempre vazios, justamente como representativos da forma como os personagens se sentem. A maneira como atores e objetos estão postos em cena são o trunfo do filme, além de uma visão pessimista sobre a vida humana, através da comédia. Talvez por isso, a única cena feliz do longa aconteça num sonho.


(500) Dias com Ela ((500) Days of Summer, EUA, 2009)
Dir: Marc Webb


É extremamente fácil gostar de (500) Dias com Ela. O diretor estreante Marc Webb faz um filme delicioso de se acompanhar e de cara estabelece empatia com seu protagonista. Tom (Joseph Gordon-Levitt) é um escritor de cartões comemorativos e se vê perdidamente apaixonado pela nova secretária da empresa, a bela e hipnótica Summer (Zooey Deschanel). O impasse maior de Tom é que Summer não quer manter um relacionamento fixo com ele, apesar de ambos passarem bons momentos juntos.

Assim, o filme abre espaço para discutir os relacionamentos modernos em que os casais têm muito mais dificuldade de manter compromissos amorosos; então, Tom sofre. Na verdade, sentimos todas as oscilações de estado de espírito do personagem, através de uma narrativa totalmente não-linear que nunca deixa a história perder o ritmo. Destaque para um ótimo roteiro que sabe ser afetivo, engraçado, leve e melancólico sem perder no fator inteligência. A restrição é que Summer devia ser defendida por uma intérprete melhor do que Zooey Deschanel. Mas a beleza da garota ajuda bastante.


Tão Longe, Tão Perto (In Weiter Ferne, So Nah!, Alemanha, 1993)
Dir: Wim Wenders


Filme continuação da obra-prima Asas do Desejo, esse Tão Longe, Tão Perto logo chama atenção para uma mudança de tom. Se no filme anterior a poética da narrativa estava a todo tempo presente, aqui a atmosfera se torna um tanto mais carregada, muito embora Wenders nunca deixará seu filme desprovido de sensibilidade. Dessa vez é o anjo Cassiel (Otto Sander) que quer se transpor para o mundo dos humanos e faz isso despropositadamente, embora seu desejo de poder experimentar as sensações mundanas já fosse visível.

No entanto, Cassiel vai se deparar com situações mais perversas do que Damiel (Bruno Ganz), do filme anterior, personagem que reaparece aqui já com família estabelecida. Na Alamenha pós queda do Muro de Berlim, Cassiel terá seu caminho trespassado por mafiosos que lhe apresentarão o lado mais perverso do ser humano e o ex-anjo passa a percorrer caminhos tortuosos. Assim, o filme é um tanto mais duro, e é uma pena como o protagonista seja mostrado de forma tão imatura, o que não parece combinar com sua persona quando anjo. E nesse mesmo caminho, Wenders perde em alguns momentos sua usual sutileza. Mesmo assim, o diretor continua fazendo reflexões sobre o tempo e a condição humana.


A Onda (Die Welle, Alemanha, 2008)
Dir: Dennis Gansel


Seria possível que um regime totalitário voltasse a ocupar o poder depois de já termos conhecimento das atrocidades cometidas por um anterior? Essa é a pergunta que A Onda procura fazer, e sendo a resposta positiva, tenta provar suas consequências. Rainer Wenger (Jürgen Vogel) é um professor que resolve fazer um experimento com seus alunos: ele cria um grupo designado de A Onda, chefiado por ele, que deve seguir um padrão de comportamento e total obediência a seu líder, já que a palavra de ordem é disciplina e união, coisa que ele consegue sem muito esforço.

Embora acreditar nessa ideia seja um tanto forçado e os personagens dos alunos surjam um tanto estereotipados pelo roteiro (a cara durão, o jogador de polo individualista e popular, a garota inteligente que será a única a ver o absurdo da situação), Gansel filma tudo com muita competência e agilidade, ganhando ritmo na edição. O final impetuoso já era esperado e ainda consegue soar muito convincente, além de assustador por percebermos até que ponto pode chegar a mente humana.

5 comentários:

Wallace Andrioli Guedes disse...

Acho A ONDA uma ótima oportunidade de reflexão jogada fora em uma traminha adolescente à lá Malhação...
Para ver TÃO LONGE, TÃO PERTO, preciso rever ASAS DO DESEJO, algo que pretendo fazer em breve...
Perdi GIGANTE quando passou aqui em JF. Agora, só em dvd.
E 500 DIAS COM ELA eu quero muito assistir, talvez role nessa semana agora...

Kamila disse...

Perfeito teu comentário sobre "A Onda", o único dos filmes que conferi do post. No mais, estou doida para ver "500 Dias com Ela". Tá todo mundo falando bem da obra.

Rafael Carvalho disse...

Então Wallace, A Onda lembra em muitas partes Malhação mesmo, mas acho que o filme consegue fazer algumas boas reflexões sobre a sociedade (alemã?) atual, mesmo que rasamente. E não deixe de ver os outros, mesmo o Tão Longe, Tão perto que me pareceu uma decepção.

Valeu Kamila, o (500) Dias com Ela é uma delícia de se ver. Toma gosto fácil, fácil.

Iulo Almeida disse...

Vários filmes alemaes, hein? Gostei haha

Rafael Carvalho disse...

Iulo, na verdade, verdadeira, os dois primeiros só são coproduzidos pela Alemanha, não são alemães. Gigante é uruguaio e Vocês, os Vivos é sueco. Mas valeu a intenção.