sábado, 12 de novembro de 2011

Mostra Cinema Conquista – Diário #4


Acabou-se (CE/BR, 2011)
Dir: Patrícia Baía


Marcado por um tom lúdico, Acabou-se fala da ideia de finitude (já marcada desde o título da obra) a partir da imaginação fértil de uma garotinha no interior do Ceará em meio a uma paisagem árida. O filme brinca com poder da imaginação no sentido de recriar e também de reviver (ou trazer à vida) figuras ou momentos que já não pertencem mais ao presente.

Patrícia Baía tem um cuidado extremo ao filmar tudo com propriedade, dotando seu curta de uma beleza plástica que revela não só sensibilidade como compreensão estética do que está fazendo, além da beleza de fotografia. Somente às vezes soa um pouco forçado, mas nada que tire a singeleza de seu trabalho. Por mais que as situações não sejam exatamente claras, fica a impressão de um filme sobre um rito de passagem de uma garotinha (mais um nessa Mostra depois de Uma Primavera), só que dessa vez um pouco mais duro.


De Lá Pra Cá (RS/BR, 2011)
Dir: Frederico Pinto


Primeiro De Lá Pra Cá nos apresenta a um homem e uma mulher em suas rotinas diárias de trabalho e dentro de casa, embora eles nunca se encontrem juntos nesse mesmo espaço. Mas aos poucos vamos sendo informados, através de detalhes, nunca dito de fato, que eles são casados, mas pouco se veem porque ele é segurança e ela, doméstica, um trabalha toda a noite, ela todo o dia. Quando se encontram? Somente num curto período em que se esbarram na estação de trem.

É muito singela a atmosfera que o filme cria sobre esses personagens, conferindo-lhes dignidade e um enorme carinho; a própria ideia de um casal que só se une por poucos instantes já é por si só bela na sua melancolia. No entanto, o filme não consegue ultrapassar esse argumento, apostando na sinceridade dos sentimentos que aquele casal ainda possui, apesar da dificuldade que é mantê-lo.


Na Quadrada das Águas Perdidas (PE/BR, 2010)
Dir: Wagner Miranda e Marcos Carvalho



Na Quadrada das Águas Perdidas é o nome de um disco que o cantor e compositor conquistense Elomar Figueira de Melo gravou e lançou no final dos anos 70, um de seus primeiros trabalhos. Os diretores Wagner Miranda e Marcos Carvalho usam as músicas que compõem esse disco e outras canções para dar vida a um filme sobre a busca no universo do sertão nordestino.

E é muito importante a presença da música (composições assinadas por Matingueiros, Geraldo Azevedo e o próprio Elomar) num filme em que praticamente inexistem diálogos. Ora, o personagem que vai sair em viagem num dia qualquer num tempo perdido interage basicamente com a paisagem ao redor. E por isso é muito gratificante ter um Matheus Nachtergaele compondo esse sujeito do qual nada sabemos a respeito de sua vida e sua história, mas do qual nos familiarizamos desde o princípio.

Dirigindo uma carrocinha caindo aos pedaços, levada por um jegue e de posse de duas cabritinhas e de alguns poucos mantimentos e pertences, esse homem sai de sua casa (onde parece viver sozinho) e ganha a estrada de chão. Seu destino parece incerto, não pra ele, que segue com determinação pelo caminho, se virando como pode.

Ao mesmo tempo, o filme revisita os elementos do imaginário folclórico desse ambiente já um tanto saturado pelo cinema. Há um esforço de mostrar diversas facetas, indo dos perigos aos prazeres daquele universo. No entanto, de uma forma geral, predomina um tom mais lúdico e apaziguador, além de umas doses de humor, num ambiente tão marcado pela dor e sofrimento.

Nesse sentido, a comida ganha um destaque muito pertinente no longa. É sabido da seca e pobreza que tanto assolam a vida de muitas famílias daquela região e que a falta de alimento (dificuldade de colher e de comprar) é uma constante. Por isso, o filme valoriza bastante os momentos em que o personagem procura e encontra alimento em meio à paisagem árida. Por isso, o melhor momento do filme se dá durante um sonho em que o protagonista se encontra diante de um banquete de farinha. Pura e seca. Mais nordestino, não há.

Interessante perceber também como a fotografia do filme tem um ar dos mais naturais, longe daquele tipo de iluminação forte e quase artificial comumente usada para compor a paisagem nordestina. Assim, a atmosfera do filme se mostra mais palpável e sincera, longe de idealizações.

Mas mesmo com todas essas qualidades, a narrativa nem sempre consegue manter o mesmo nível de interesse já que as situações de busca de comida, principalmente, acabam ficando repetitivas, mudando somente de objeto de desejo. Nosso herói parece ter um destino definido, embora só descobriremos qual é na conclusão do longa. E não existe nada de grandioso nele, o que importa mesmo é o processo de chegada até lá.

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