terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Olhar de criança

Mutum (Idem, Brasil, 2007)
Dir: Sandra Kogut


Desde quando Mutum recebeu o Troféu Redentor de Melhor Filme, prêmio máximo do Festival do Rio ano passado, que minhas expectativas para assistir ao longa só iam aumentando. Fazendo jus à excelente safra de filmes nacionais lançados em 2007, essa estréia da diretora Sandra Kogut na ficção me surpreendeu bastante. Adaptado da obra do escritor mineiro Guimarães Rosa, Mutum é um exemplo claro do quanto de beleza se pode extrair uma narrativa tão naturalista, mas emocionalmente intensa.

Não existe uma trama exata, mas passamos a acompanhar o cotidiano do pequeno Thiago, garoto de 10 anos, e sua humilde família que vive numa região isolada no sertão de Minas Gerais, chamada Mutum. É através de seu olhar inocente que desvendamos o complexo mundo dos adultos, seus conflitos e percalços. Tais dramas atingem o garoto inevitavelmente, obrigando-o a um amadurecimento um tanto precoce.

O roteiro expira uma atmosfera de inocência tamanha que só poderia mesmo fazer parte do universo infantil; as brincadeiras, o teor frágil das conversas e aquelas risadas gostosas que são próprias da alma das crianças. No caso de Thiago, muito dessa inocência é interrompida pela necessidade de lidar com as conseqüências provocadas pelas ações dos adultos (mãe, pai e tio, em potencial, no seu caso). Muitíssimo bem interpretado pelo jovem Thiago da Silva Mariz, o protagonista não tem culpa dos atos de seus familiares, mas mesmo assim sofre os danos de tais atos, tendo que ser “expulso” de seu mundo particular.

Além disso, o texto é de uma sutileza incrível e aposta na sensibilidade do público para conduzir a história, sem nunca cair no exagero (a morte de determinado personagem, por exemplo, é extremamente tocante, mas nunca soa forçada). O filme aposta também na ótima química entre os atores, quase todos desconhecidos do grande público (salvo o sempre ótimo João Miguel interpretando o pai de Thiago) e que possuem uma familiaridade muito grande com o ambiente da fazenda. O elenco foi majoritariamente escolhido entre os moradores das regiões das filmagens.

Com câmera na mão, fotografia natural e privilegiando o som ambiente, com o devido respeito aos silêncios, Kogut transmite leveza ao filme, que não deixa de possuir densidade dramática nos momentos certos. Simples e denso. Complexo e inocente. Acima de tudo.

6 comentários:

Anônimo disse...

Nem demorou tanto pra você assistir, hein? O filme é realmente ótimo - não foi por acaso que Carmem saiu chorando do cinema hahaha. Mas, enfim, o filme é delicioso de ver, com tendência a ser simples, mas profundo. A narrativa é muito boa, a fotografia é incrível, a atuação daquele guri é impressionante.
Uma das cenas que mais me marcou foi aquela do menino tentando ensinar o papagaio a falar o nome do outro garoto.
Um excelente filme

Anônimo disse...

Já me falaram bem desse filme. Uma pena que tenha ficado apenas duas semanas em cartaz aqui em Brasília...

Cine Ôba! disse...

Tõ muito curioso, pena que só vou vê-lo em dvd por sua exibição ter sido tão curta.

Dirigir crianças é um trabalho difícil, o que me deixa ainda mais curioso a respeito do trabalho de Sandra Kogut.

Gustavo Madruga

Dr Johnny Strangelove disse...

To devendo um comentario aqui ...
e ai amigo ... rapaz preciso disso ... de filmes nacionais sem estripulias e sim ver o sabor da terra e de somos um pais rico de temas e não de caricaturas de novelas ...
abraços

Rafael Carvalho disse...

Pois é Iulo, o filme já tinha estreado aqui em Salvador faz um tempo, quase que eu perco. E não foi só Carmen que saiu chorando do cinema não, com um filme desse é difil se segurar. Bela dica, viu! Valeu!

E pra galera que ainda não viu, realmente essa é um ótima oportunidade (viu Johnny) de pretigiar um cinema brasileiro fora dos padrões atuais. Vale muito a pena.

Gustavo, acredito que foram mais de mil crianças fazendo teste para ficar com o papel. E a direção do elenco mirim é ótima, mas é de uma naturalidade tão grande que não é preciso nem tanto esforço.

Abraço pessoal!!!

André Renato disse...

O seu último parágrafo resume muito bem o filme! E são esses aspectos que fazem dele uma ótima adaptação de guimarães Rosa.