domingo, 9 de outubro de 2011

Sem ritmo, sem alma

Família Vende Tudo (Idem, Brasil, 2011)
Dir: Alain Fresnot



Fazer comédia de boa qualidade no cinema brasileiro é tarefa das mais difíceis atualmente. Ou então, está se tornando cada vez mais um comodismo se refugiar num formato de sitcom televisivo que reprocessa o mesmo tom exagerado e farsesco (grande parte dos filmes, inclusive, vêm com o selo Globo Filmes de “qualidade”, inclusive esse aqui). Salvo algumas exceções no panorama nacional (Jorge Furtado, Domingos de Oliveira), a comédia é um dos gêneros que mais sofrem na nossa terra.

Geralmente os argumentos dos filmes são idiotas, os personagens idem, as piadas indo do ridículo ao obsceno, tudo embalado numa roupagem tecnicamente bem composta. Pois no caso de Família Vende Tudo acontece um processo inverso: falta justamente atributos cinematográficos (não técnicos, mas narrativos) para que sua proposta seja levada adiante. Não que ela seja necessariamente incrível, mas que poderia encontrar chances maiores de sucesso caso fosse melhor orquestrada.

Um família de classe baixa vive da revenda ilegal de produtos que contrabandeia do Paraguai. Quando sua mercadoria é toda apreendida pela polícia e a família se vê em dívida com sujeito mal encarado da vizinhança, eles resolvem usar a filha Lindinha (Marisol Ribeiro) para dar o golpe do baú no cantor brega/sertanejo Ivan Cláudio (Caco Ciocler).

Enfim, uma proposta cheia de possibilidades cômicas (como quase praticamente tudo pode ser). Mas o que faz do filme um desastre é a total falta de timming. E como falta o tempo todo, o desastre é completo. Os diálogos são fracos, mas quando aparece alguma piada ou situação com potencial cômico, é sabotada tanto pela falta de ritmo dos atores com o próprio texto, como por uma montagem sem a menor desenvoltura. O filme se desenrola todo no piloto automático, como se fosse um ensaio preguiçoso. Ou seja, mais que tudo é um grave problema de direção não perceber todos esses entraves.

Assim, desperdiça algumas boas ideias da história. Por exemplo, existe um tratamento muito interessante dado a essa família pobre, que batalha diariamente para conquistar seu ganha-pão, mas que não pensa duas vezes ao apelar para o oportunismo para sair do aperto. E o filme nunca os condena, não os julga enquanto decidem pelo caminho mais amoral ao usar a própria filha como isca sexual.

Há ainda certa crítica social não forçada (e por isso, talvez, a mais eficiente do filme) sugerida pelo irmão mais velho de Lindinha (vivido pelo ótimo Robson Nunes), evangélico praticante, que não concorda com a atitude da família, mas ajuda e torce em todos os momentos para que o golpe dê certo.

Por outro lado, a história se desdobra para apresentar uma série de personagens caricaturais, a começar pelo próprio cantor sertanejo com seus trejeitos de mulherengo e caipira pós-fama. Ou então a pastora que prega a cegueira aos fiéis, a apresentadora do programa de fofoca sensacionalista, a mulher traída do cantor, a empresária oportunista. Enfim, uma série de tipos que povoam o universo lugar-comum de um filme sofrível.

4 comentários:

Kamila disse...

O grande problema desse filme, pra mim, foi que ele tinha um grande potencial pra fazer uma crítica legal, mas acaba se perdendo por completo. Fora a impressão de que "Falsa Loura" fez tudo o que esse filme deveria ter feito de forma melhor...

Amanda Aouad disse...

Pois é, uma boa idéia desperdiçada por um autor que já soube nos dar obras muito melhores. Uma pena.

ANTONIO NAHUD disse...

Que pena... e eu estava todo empolgado para vê-lo.

O Falcão Maltês

Rafael Carvalho disse...

Kamila, se perde e muito, tudo culpa dessa falta de timing de todos os envolvidos. Falsa Loura me parece um filme com um tom totalmente diferente, sem a comédia e com o discurso social, mas é quase uma covardia comparar com um filme do Reichenbach.

Com certeza, Amanda. E o mais interessante é que ele já trabalhou com comédia antes, não devia nos apresentar uma vergonha dessas.

Coragem, Antonio, e vá ver, mas espere por uma bomba. Um dos piores filmes do ano. O Brasil sempre faz umas pérolas dessas!