segunda-feira, 12 de abril de 2010

Universo particular

Onde Vivem os Monstros (Where the Wild Things Are, EUA, 2009)
Dir: Spike Jonze


Por trás da aparência infanto-juvenil que o novo filme de Spike Jonze possa ter, existe todo um universo psicológico e complexo, mesmo que seja o de uma criança. Max (Max Records) é um garoto hiperativo, mas não tem com quem compartilhar sua fértil imaginação nem sua disposição para a aventura.

Sua irmã mais velha está descobrindo a adolescência ao lado dos amigos maiores enquanto sua mãe divorciada está mais preocupada com o trabalho; seu pai é figura ausente, não se sabe por que motivo. A solidão de Max dá vazão a sua mente fantasiosa.

Assim, durante um briga com a mãe, o garoto foge pela rua e, em seguida, já se encontra num mundo imaginário habitado por estranhas criaturas que se assemelham a bonecos gigantes. Lá, Max será proclamado rei e dono de todo aquele território, como gostaria de ser toda criança.

O filme abraça essa proposta lúdica da forma mais deliciosa possível. Ao mesmo tempo que todo aquele universo representa os anseios e questionamentos do protagonista, sendo possível identificar personalidades do próprio Max dentro de cada um daqueles seres, o inconsciente do garoto parece trabalhar no sentido de levar para aquele ambiente situações e experiências que ele vivencia e conhece no mundo real, sem que isso passe necessariamente pelo racional do garoto.

Por isso, o mundo imaginário e fantasioso de Max, cheio de aventuras, brincadeiras, diversões e sonhos de grandeza, se mistura com suas inseguranças e problemas de menino, ganhando dimensões psicológicas que na tela transparecem com uma leveza absurda, residindo nas entrelinhas. Assim, o infantil se torna complexo, mas tudo vem numa roupagem deliciosa de brincadeira de criança.


O ator mirim Max Records trabalha com uma naturalidade impressionante, da mesma forma que Jonze conduz tudo com enorme fluidez, porque ele parece entender exatamente a cabeça de seu protagonista. A trilha sonora é uma delícia, assim como aspecto retrô do desenho dos bichos da floresta. Bichos selvagens que parecem habitar cada um de nós.

7 comentários:

Alex Gonçalves disse...

Não tenho tanta curiosidade em assistir este filme, mas há um trabalho de Spike Jonze que me impressionou tanto (no caso, "Adaptação") que ao menos me faz ter uma boa impressão desse seu mais recente trabalho. Agora é testemunhar se esse universo fantasioso da narrativa impressiona de fato.

Unknown disse...

Esse filme me emocionou bastante! É de uma força arrebatadora, além de ser tecnicamente perfeito. E repito: ele talvez possa ser para essa geração que está aí o que História sem fim foi para a minha.

Abs!

Gustavo disse...

Filmes com esse tipo de história me pegam em cheio. Só posso escrever que quero muito compartilhar dessa admiração.

Leandro Afonso Guimarães disse...

Acho que poderia ser um filme muito melhor.

Ele flui, é verdade, e é mais que convincente a sensação de se estar numa infância de fato, vivida por uma criança com um espírito de criança - só que num mundo possível somente no cinema.

Por outro lado, a ideia das cenas e a descrição delas sempre me parece melhores que elas em si. Gondry carrega bem o filme, mas não filma tão bem - embora talvez o primeiro só seja possível por causa do segundo.

Mas é um belo filme ainda assim.

Rafael Carvalho disse...

Alex, sabe que Adaptação é um filme do Jonze que eu preciso rever. Mas no geral, gosto muito dos filmes do Jonze. É um cineasta que escolhe bem com quem trabalha.

Dudu, muito boa essa relação do filme com História Sem Fim, eles são bem complementares mesmo. E possuem uma carga emotiva bastante verdadeira e inocente!

Gustavo, veja assim que puder, o filme é no mínimo emocionante, mas na medida certa.

Leandro, acho que a intenção das cenas é mais importante do que a concretização de tudo em si. Se tudo fosse muito perfeito e estilizado, não teria "cara" de imaginação, ainda mais de criança. Nesse caso, as "imperfeições" contribuem para o conceito geral do filme. E o filme é do Jonze, não do Gondry. Ainda bem.

Fred Burle disse...

Legal o texto, Rafael. Concordo com tudo. Este é, para mim, um dos melhores filmes deste ano. Pelo menos em mim ele conseguiu despertar "a criança"...

Rafael Carvalho disse...

Também nutro desse mesmo sentimento, Fred. Dá saudade daquele tempo em que tudo era muito melhor e mais legal.