Avó (Amama,
Espanha, 2015)
Dir: Asier Altuna
Assim como no ano passado, o Cine Ceará exibiu Floreak, filme do país basco, região e
cultura pouco conhecida, tanto eclipsada pelo poderio de atração espanhol. Esse
ano foi a vez do longa Avó aportar na
mostra competitiva, mais um drama familiar, assim como o filme anterior, com
destaque para a tradição e as raízes de uma família rural basca.
Todo
falado em língua eusquera, o filme nos apresenta uma família que vive num caserío, espécie de grande propriedade
rural muito comum na região basca. Há o pai rígido e durão, mantenedor das tradições,
em especial na dedicação total à terra, plantio de alimentos e criação de
rebanhos, como forma de economia de subsistência. No outro polo, uma das filhas
(Iraia Elias) é quem vai questionar o estilo de vida tradicionalista da
família, batendo de frente com o pai rude.
O
filme é muito rico em simbolismos e remete a um estudo de personalidades
marcadas pelo uso de cores fortes. A avó é uma personagem que não diz uma única
palavra durante o filme, mas possui uma presença de cena marcante, espécie de
entidade ligada à tradição que observa atenta o embate de gerações. Ela tem
dons artísticos e, logo no início do filme, aparece pintando três árvores da
propriedade de cores diferentes, o que remeteria à personalidade de cada um dos
três herdeiros – há ainda outros dois, homens que lidam melhor com as ordens do
pai e da tradição.
A árvore e, por conseqüência, a madeira, assim como as
cores, são signos constantes a marcar os passos dos personagens, o que acaba tornando
o longa muito prescritivo. É como se já estivesse posto, a preceder os
personagens, uma espécie de personalidade programada que os faz responder a
certos estímulos já previamente codificados, e não como algo que emane deles
com naturalidade e verdade. O filme também abusa de certa estética artsy,
querendo impressionar a todo instante pela beleza estética das coisas – certo
velório, por exemplo, é filmado quase como uma instalação-blasé, que ganha
plasticidade, mas perde na emoção.
O filme também apresenta um contraponto com o país basco
cosmopolita e moderno, mais uma vez reforçado pela figura da filha que não quer
terminar seus dias arando a terra do caserío.
Todo o conflito da família passa por essa questão, e o filme quase cai na armadilha
de filmar o esfarelamento da família a partir do drama gritado, das brigas ininterruptas
que só servem para disparar espinhos entre os familiares.
Avó sai-se melhor
quando consegue apresentar uma curva dramática que faz aquelas pessoas se
reconhecerem como pertencente a um mesmo núcleo fortemente ligado por laços sanguíneos,
apesar de acentuarem e nunca deixarem de lado suas concepções de vida e
desavenças. É quando o filme ganha mais em complexidade, e os dramas dos
personagens ganham mais força que os meros simbolismos.
Epitáfio (Epitafio,
México, 2015)
Dir: Yulene Olaizola e Rubén Imaz
Pode-se dizer que Epitáfio
é como um épico silencioso. O filme remonta ao início do século XVI quando os
primeiros conquistadores espanhóis chegaram e desbravaram a região onde hoje se
encontra o México. Diego de Ordaz, um dos conquistadores da região, figura
real, porém pouco conhecida e menos reverenciada dentre os “heróis” que marcaram
seu nome na História de conquista do Novo Mundo, é esse personagem que o filme
observa a desbravar o lugar.
Junto com um pequeno grupo explorador, desejam chegar ao
topo do vulcão Popocatéptl. Pode espantar que essa paisagem, naquela
circunstância, é tomada por um inverno rigoroso, com direito a espessa camada
de neve no chão, nevoeiros e frio cortante. Epitáfio
apresenta um tour de força para seus personagens, provação que exige grande
esforço físico e mental.
Logo de início, o filme já deslumbra o espectador por uma
concepção visual muito apurada, fotografia que em nada lembra as cores quentes
da geografia mexicana mais exótica. O contraponto da bela paisagem natural com
os perigos mortais que ela também oferece está impresso desde as primeiras
cenas.
O embate do homem com a natureza inóspita não é algo novo
aqui, e o filme tem certa dificuldade para conferir interesse na jornada desses
homens para além disso, a despeito de todo o conhecimento posterior que temos da
exploração colonizadora europeia e suas devastadoras consequências para os
povos nativos.
Epitáfio busca
mesmo na jornada particular daquele grupo, partindo quase de uma introspecção e
desejos individuais de vitória, o estado de ganância e a obsessão por
conquistar novas terras no território desconhecido. Pena que poucas vezes o
filme consiga encontrar mais nuances na formatação desses personagens e nos
eventuais conflitos que surgem entre eles. Resta então dar voltas em torno das
mesmas questões e abusar do tom de cansaço e estafo constante.