Tudo Começou pelo Fim (Todo Comenzó por el Fin, Colômbia, 2015)
Dir:
Luis Ospina
Um
homem sexagenário recebe notícias de complicações de um tumor estomacal depois
de outros problemas graves e sucessivos de saúde. Esse homem é o próprio
diretor do filme, o veterano cineasta colombiano Luis Ospina. Com projeto de rodar
um novo trabalho, passa a correr contra o tempo para finalizar o projeto que
toma outro viés, partindo da própria condição de saúde do diretor.
A
obstinação de Ospina pelo filmar está inscrita desde o início: com uma câmera
simples de celular e com a ajuda da companheira que lhe segue, ele registra
tudo, mesmo os passos mais corriqueiros e os mais tenebrosos nos quartos e
corredores do hospital. Mas é só o pontapé para o baú de memória que o filme
abre. E o que parecia uma história sobre si mesmo ou sobre a doença e as
agruras que isso causa num senhor de sua idade, passa a ganhar outra dimensão.
Tudo Começou
pelo Fim,
em primeira medida, é um filme de uma generosidade gritante. A luta pessoal de
Ospina contra a doença fatídica cede lugar ao rico mosaico que ele faz de sua
vida, em retrospecto, a partir de fins dos anos 1960. E isso significa, de modo
imediato, falar de seus amigos, de suas jornadas e da união de um grupo que
viveu junto os anos de formação pessoal e profissional em torno do cinema, do
amor pela arte, do vigor por aquilo que eles amavam e no qual acreditavam.
Para
tanto, o cineasta não se apega a limites temporais. Com cerca de três horas e
meia de duração, o filme vai apresentando, aos poucos, os amigos que fizeram
parte daquela trupe, as pessoas que caminharam com Ospina o caminho do
aprendizado e da descoberta do cinema como artefato de resistência, também do
aprendizado emocional, do risco de se fazer cinema como eles faziam numa
Colômbia sem grande tradição e vocação: de modo rústico, anárquico, contra
convenções e regras caretas.
Essa
abertura para com o retrato de sua geração que o filme promove é também ela um
aspecto de surpresa, pois o filme assim vai se moldando. Detém-se nas figuras e
episódios que marcaram a vida deles, e o faz com um carinho e admiração latentes.
À vasta coleção de imagens de arquivo, seja dos registros amadores, dos
próprios filmes realizados ou dos bastidores dessas produções, soma-se o
registro de um almoço especial que reuniu esses mesmos personagens nos dias
atuais, tal como um encontro especial de uma turma das antigas.
Ospina
revisita lugares e memórias, suas e dos seus companheiros, e aproveita também
para lhes tomar a palavra, resgatando momentos e situações vividas através das
recordações do outro e ainda aproveita para acertar as contas com o passado e,
em último esforço, homenageiam aqueles que já se foram. Resgata com isso tudo o
espírito de uma época, além de repassar a própria história da Colômbia.
Não
é pouca coisa. É na capacidade de articular todos esses elementos, de modo claro
e preciso, que o filme encanta pela sinceridade e amor que transbordam da tela.
A longa duração não mais incomoda porque há muita riqueza naquela(s)
história(s) – e menos na narrativa em si que segue o estilo despojado de Ospina
e seu grupo. No filme de um diretor que se volta tanto para si mesmo, Tudo Começou pelo Fim acaba por ser uma
bela homenagem ao outro, que também é parte dele (de nós). Mesmo com a doença e
o futuro incerto, a vida é uma festa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário