sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Mostra de Tiradentes – Parte III


Revoada (Idem, Brasil, 2014)
Dir: José Umberto Dias 
 
Ao apresentar seu filme na Mostra Autorias, reservado a cineastas veteranos, o cineasta José Umberto Dias fez uma relação entre a arquitetura e arte barrocas vistas em Tiradentes com a estética de seu próprio filme. Nada mais apropriado, pois Revoada alimenta-se do excesso e do rebuscamento formal para olhar para o fim do cangaço, tema tão caro ao cineasta.

O filme acompanha um grupo de cangaceiros liderados por Lua Nova (Jackson Costa). Eles recebem a notícia da morte de Lampião e seu bando. Resta então seguir em fuga ou partir para o enfrentamento, já que a polícia (ou os macacos, como são chamadas) está em seu encalço.

A escolha de José Umberto é menos fazer um apanhado de cunho histórico e mais uma alegoria visceral, ainda que o filme permaneça num mesmo tom até o fim. Corisco e Dadá, os mais fieis seguidores de Lampião, sobreviventes da chacina que matou o líder, surgem diluídos em outros personagens, nunca explicitamente nomeados. Mas são suas figuras de resistência e destemor que compõem esses tipos que enfrentam aquele mundo de poderes opressores.

São evidentes no filme referências cinemanovistas, especialmente com ecos de Glauber Rocha. José Umberto parte do excesso, seja nos cortes rápidos e secos, nos diálogos marcados pela fala sertaneja bem carregada, uma trilha sonora retumbante e até mesmo no colorido das roupas dos personagens, tudo para dar uma atmosfera quase operística ao longa.

É certo que esse o tom excessivo por vezes soe exagerado ou até mesmo cansativo em alguns momentos, já que o filme mantém esse ritmo do início ao fim. É fácil confundir o que há de atropelo com a própria estética vivaz do filme. Mas sua proposta é mesmo de ser uma narrativa de urgência, potente e desafiadora.


As Fábulas Negras (Idem, Brasil, 2015)
Dir: Rodrigo Aragão, Joel Caetano, Petter Baiestorf e José Mojica Marins

A Mostra de Tiradentes programou uma sessão pós meia-noite para exibir um exemplar sui generis do cinema de horror trash que vem sendo cultivado numa certa cena independente do Brasil. O responsável apaixonado por esse tipo de produto B cult é o capixaba Rodrigo Aragão, já um expoente contemporâneo do gênero.

Aqui, ele se reúne com outros cineastas, com presença luxuosa de José Mojica Marins, para criar um mosaico de narrativas deliciosamente aterradoras, com algo de humor, mas muito de podridão, sangue e vísceras.    

Monstros de esgoto, Saci, a loira do banheiro, lobisomem, Iara. Figuras míticas e lendas urbanas tão brasileiras são reinventadas aqui em outra chave de gênero. Se temos o costumeiro longa dividido em episódios dirigidos por cineastas diferente, é fácil perceber uma unidade plástica que agrupa o espírito travesso dos contos. Certamente alguns são melhores que outros.

O segmento da loira do banheiro, comandado pelo Joel Caetano, é o que mais se sobressai. Olhando com cuidado, nota-se ali uma noção muito apurada de encenação, rendendo bons momentos de suspense, numa história não tão previsível como poderia ser. 

Mojica, o eterno Zé do caixão, que também faz uma ponta no episódio do lobisomem dos pampas gaúchos, é mais do que uma presença ilustre – seu curta é mais interessante por tê-lo de volta à ativa do que por criar uma narrativa de destaque, apesar do Saci macabro ser uma novidade. Mas como pai de uma estética trash no cinema de horror nacional, sua presença só coroa um projeto muito coeso – e aterrador – como esse.

2 comentários:

Anônimo disse...

Só corrigindo, o segmento da loira do Banheiro foi dirigido por Joel Caetano!

Rafael Carvalho disse...

Opa, falha minha. Já corrigi. Abraço.