Mate-me
Por Favor (Idem,
Brasil/Argentina, 2015)
Dir:
Anita Rocha da Silveira
Dos
retratos de juventude muito comuns nas narrativas do cinema, em especial no
filme de formação, de rito de passagem, Mate-me
Por Favor vem a se somar não só como uma representação muito particular de
certa juventude, mas que também não se limita a reproduzir lugares-comuns desse
tipo de gênero, o filme teen. Anita
Rocha da Silveira mira em outro tipo de abordagem que faz pulsar essa
juventude, ao mesmo tempo em que a faz encontrar uma morbidez incomum nessa
idade.
Essa
representação juvenil chega com uma carga muito feminina, mesmo porque a
própria cineasta já revelou o quanto o filme guarda muitos de seus anseios de
uma época de experiências e descobertas, certamente sem querer aprisionar suas
personagens em reproduções já gastas – e mesmo em seus curtas anteriores, como Os Mortos-Vivos e Handebol, já é possível reconhecer essas escolhas. Curioso notar
também como os adultos são figuras invisíveis para esses jovens.
Bia (Valentina Herszage) e suas melhores amigas vivem a ebulição da
adolescência, e a câmera de Anita sabe muito bem inscrever seus corpos nessa
narrativa de desejos pulsantes. Mas a esse universo das turbulências hormonais é acrescido um fator inusual: a pulsão da morte. Há uma
morbidez que invade a vida de Bia a partir do momento em que garotas de
programas começam a aparecer assassinadas, vítimas de um desconhecido serial killer. Bia se vê atraída por
esse universo fúnebre, uma espécie de encantamento pelas coisas da morte, como
um ímã que ela não consegue controlar, levando o filme para um lugar território
muito curioso de observação e construção narrativa.
Tudo
isso tem lugar na Barra da Tijuca, bairro de classe alta do Rio de Janeiro,
retratado de forma não necessariamente caricata, apesar da propensão do filme
em exceder o tom muitas vezes. Mas não na maneira de enquadrar esse espaço
urbano, antes como forma do filme alcançar outro lugar de fabulação de sua
própria história, inclusive inscrito em certos personagens, como é o caso da pastora
teen, uma barbie-patricinha frou-frou que embala cânticos de
louvação a Jesus com batida pop na igreja local.
Há
um jogo de plasticidade visual muito forte no filme que acompanha essa escolhas narrativas. Está presente nos coloridos dos cenários e também nas cenas em que o
exagero prevalece e a atenção se volta para detalhes curiosos: Bia vomitando
sangue diante do espelho do banheiro, a coreografia do passinho, as pregações
da pastora.
Mate-me Por
Favor
resvala no gênero de horror, no subgênero do filme de serial killer, é também um filme teen de coming of age, mas não parece caber nessas caixinhas classificatórias.
A obsessão de sua protagonista por um universo novo, seja o das sensações e
descobertas amorosas/sexuais, seja o da morte, é o que move a história, sendo
menos um filme de causas e consequências óbvias e muito mais atmosférico. Daí
que esse tom de excessos pinta o filme de cores muito vivas e particulares.
Não
é tarefa fácil criar esse tipo de ambientação, ainda mais quando não está
calcado em um tipo assimilável de narrativa, ou antes faz um cruzamento criativo
entre eles. Anita Rocha da Silveira sai-se muito bem nesse que é seu primeiro
longa-metragem, muito segura do tipo de construção de sensações que quer
promover. Ainda assim, sobram alguns excessos e momentos que parecem deslocados
e que não fazem muita diferença no filme – a boate que pega fogo, a disputa
gritada entre os estudantes na cantina da escola. Mas a força de sua encenação bate
forte, o suficiente para colocar Mate-me Por Favor num lugar de evidência na produção nacional
recente.
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