Jonas
e o Circo sem Lona (Idem, Brasil, 2015)
Direção:
Paula Gomes
Paula
Gomes e equipe percorreram o Estado da Bahia pesquisando e mapeando os circos
que se proliferam no interior. Num desses encontros, conheceram Jonas e sua
paixão pelo espetáculo mambembe. Quando o garoto vai morar na zona metropolitana
de Salvador, distancia-se do circo em que vivia e passa a construir, no quintal
de casa, o seu próprio.
Jonas e o Circo
sem Lona
é o retrato dessa pulsão juvenil que faz parte mesmo do sangue do garoto – sua
família tem longa tradição no circo. Ele se diverte ao dar forma a seu
espetáculo, ao preparar os números e ensinar os amigos a fazê-los; gosta também
de abrir as portas para as pessoas do bairro pobre onde mora e agradar o
respeitável público. Mas Jonas está crescendo e outros desafios se impõem ao
garoto: estudar, ser alguém na vida, almejar algo melhor. O filme encontra Jonas
dividido entre o sonho e a vida concreta, dilema que lhe perturba, observado
pelo olhar atento da câmera de Paula.
A
diretora não se deixa deslumbrar pela simples vontade do garoto, ainda que
reverencie o misto de inocência com seriedade com que ele leva adiante seu
desejo. Filma não só as preparações no quintal, mas adentra a rotina da família,
aproxima-se da mãe e avó do garoto, acompanha Jonas na escola. Aliás, a mãe é
peça fundamental aqui porque é ela a responsável por acordar o jovem e chamá-lo
para o mundo real. É ela quem mais lhe cobra uma postura realista e,
consequentemente, adulta da vida.
Jonas e o Circo
sem Lona
sabe ser cru, árido, e mesmo duro, ao não se esquivar dos atritos que
atravessam o caminho e as vontades de Jonas – há uma cena particularmente forte e marcante que
envolve o depoimento da professora do colégio, não só sobre os passos do garoto
como sobre o próprio filme. Ao mesmo tempo, a obra consegue ser terna e
sensível ao se interessar não pelo circo em si, mas pelo brilho no olhar de
Jonas quando está imerso em seu mundo de fantasia e atrações.
Há
uma proximidade afetuosa entre a diretora, Jonas e sua família que reflete a
maneira como o próprio filme se posiciona diante das questões que se impõem ao
garoto, fazendo de Paula também uma personagem ali. Mesmo que esteja sempre
fora de quadro, ela fala e se dirige diretamente a todos em cena, sempre do modo
mais carinhoso – a mãe de Jonas chama-a de “Paulinha”, por exemplo. Esse
aspecto doce não deixa de esconder a posição da diretora em prol do menino – o
que fica claro, por exemplo, na visita ao circo do tio de Jonas, lugar onde ele
adoraria morar (e por ele se enamorar mais uma vez), algo como uma possível
opção para ele –, embora Paula saiba entender e respeitar as forças contrárias
que se processam no âmbito daquela família. Em alguns momentos, porém, as
observações da diretora podem soar um tanto ensaiadas demais – assim como do
filme não escapam momentos de maior encenação –, como se já previstas
anteriormente, mas sempre abrigadas no campo do afeto.
É
muito fácil falar de circo e apelar para um caminho romântico em que noções
como os de “sonho”, “magia”, “imaginação” e “infância” surjam como protótipos
intrínsecos a essa experiência e vivência, de quem faz o espetáculo e de quem o
assiste, uma espécie de relação óbvia e incontornável. Pois Jonas e o Circo sem Lona beira essas
questões, mas tem uma bússola moral que não desvirtua o filme em prol de um
pieguismo simplista: o aspecto da vida real, esse que bate à porta e cobra do sujeito
uma postura no mundo. O filme sabe que o verdadeiro espetáculo que não pode
parar é o de crescer e amadurecer.
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