domingo, 17 de maio de 2015

O absurdo do banal

Um Pombo Pousou num Galho Refletindo Sobre a Existência (En Duva Satt På En Gren Och Funderade På Tillvaron, Suécia/Alemanha/Noruega/França, 2014)
Dir: Roy Andersson
 


Um pombo num galho, empalhado, numa redoma de vidro; um homem, bastante pálido, observa o animal. O tempo parece suspenso, a câmera está fixa, pouco movimento dentro do quadro, fotografia monocromática. Assim começa esse curiosíssimo filme que parece se mover em uma outra dimensão de realidade. 

Esse tipo de tableau vivant se repetirá formalmente por todo o longa. Na verdade, trata-se de um dispositivo narrativo já usado por Roy Andersson em seus trabalhos anteriores, Vocês, os Vivos e Canções do Segundo Andar. Perfazem uma espécie de trilogia dos absurdos cotidianos, via humor negro na maneira de olhar para pequenas desgraças humanas.

Ou não tão pequenas assim: esse novo filme começa com observações sobre a morte e algumas de suas idiossincrasias – sem deixar de serem hilárias, diga-se. Mas logo torna-se um amontoado de situações em que os personagens misturam-se e retornam momentos depois, enfrentando conflitos por vezes banais, porém com consequência tragicômicas.

O absurdo filosófico e um tanto quanto calculadamente “pedante” do título ganha um contorno perceptível: as mini-situações aqui apresentadas são pinçadas de uma realidade que se querem nonsense e, por isso mesmo, interessantes de serem postas em cena. O aspecto morto-vivo que os personagens sustentam, o rosto de uma palidez assombrosa, só contribui para esse estado de suspensão em que parecem circular aquelas almas. 

Há algo de Jacques Tati nessa construção de quadros em que a atenção do espectador pode ser levada a se fixar em certo ponto, diversos são os elementos que estão distribuídos no plano. É o tipo de filme que brinca com as percepções daquilo que temos diante de nós e daquilo que somos levados a perceber mais detidamente. Pode soar formalista demais, mas no fundo é muito gracioso, perseguindo situações bizarras. Tão estranhas como pode ser o próprio dia a dia.

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