O ano acaba e sempre ficam os vários filmes sobre os quais eu gostaria de ter escrito este ano, mas por diversos motivos, contratempos e necessidades não pude assim fazê-lo. Tento tirar um pouco do atraso com esses últimos textos curtinhos sobre filmes do ano. E 2011 foi bom em números: até então 322 filmes (fora umas 30 revisões), sendo que desses, 160 são de produções lançadas comercialmente no mercado nacional, seja nos cinemas ou direto em DVD. Só me resta desejar que 2012 continue repleta de (bons) filmes. A todos, feliz ano novo.
A Serbian Film – Terror sem Limites (Srpski Film, Sérvia, 2010)
Dir: Srdjan Spasojevic


O grande problema do filme é tentar incutir o horror por uma coisa que já é por si só repugnante (ou alguém aí é a favor da pedofilia e estupro?). Existe um discurso quase gritante para que o espectador sinta pura repugnação, o tempo todo reiterada pelo filme a cada nova crueldade que o personagem é obrigado a cometer. No fim das contas, nem vale por toda a defesa feita pela liberdade de expressão das obras de arte (sim, considero qualquer filme uma peça de arte), embora seja contrário a qualquer tipo de censura. Mas melhor se fosse por um filme que valesse mais a pena.
Contra o Tempo (Source Code, EUA/França, 2011)
Dir: Duncan Jones


O filme explora muito bem a ideia de voltar ao passado, pois não se quer mudar o curso do que já aconteceu, mas sim encontrar o responsável por uma catástrofe que está prestes a se repetir. Além disso, Duncan Jones filma muito bem as constantes voltas às mesmas situações, sempre a partir de um ponto de vista diferenciado. Ainda acrescenta um interesse romântico na pessoa da bela Christina (Michelle Monaghan), colega de trabalho do homem de cujo o corpo o protagonista toma posse. Embora se traia na sua conclusão ao insistir num final que seja aprazível e reconciliador, o filme consegue discutir a ética da vida humana em situações críticas, para além da necessidade do homem (armado do aparato tecnológico) de provar sua superioridade, e lucar com isso.
Corações Perdidos (Welcome to the Rileys, EUA/Reino Unido, 2010)
Dir: Jake Scott


Existe ainda um cuidado preciso na maneira como as informações sobre esses personagens vão sendo apresentadas pela narrativa, sem nenhum tipo de pressa, surgindo quando se tornam pertinentes às situações. É assim que vamos descobrir que a filha do casal morreu ainda adolescente num acidente de carro e mais tarde entenderemos que a mãe teve parcela considerável de culpa (por isso, ela, há anos, não sai de casa, nem dirige). É daí que iremos entender porque Douglas tem tanta predisposição em ajudar aquela menina que ele julga desamparada, numa tentativa de reavivar o cuidado paterno. Esse tipo de entendimento nunca nos é mastigado pelo filme; o espectador vai construindo essas relações sozinho, na medida em que se envolve com o esforço daquele casal e ainda torce para que aquele casamento volte aos trilhos. Com um elenco que defende muitíssimo bem seus personagens (Gandolfini e Leo estão excelentes), Jake Scott começa com o pé direito, maduro e disposto a nos entregar um produto que sabe muito bem considerar a sabedoria emocional de quem o assiste.
Compramos um Zoológico (We Bought a Zoo, EUA, 2011)
Dir: Cameron Crowe


A história é repleta de saídas fáceis que servem para deixar o espectador feliz, esperançoso, sem questionar como isso se dá no filme (exemplo: a avaliação do inspetor para aprovar o zoológico só podia ser positiva já que ele não achou nenhuma irregularidade no local, embora o filme aposte num certo suspense sobre a liberação do zoo). É o tipo de coisa que faz o espectador se sentir enganado, porque soa artificial. Além disso, os coadjuvantes são todos mal aproveitados (exceto a jeca adorável vivida por Elle Faning). Quando alcança o drama (principalmente o embate entre pai e filho), as discussões parecem rasas e mais preocupadas em soltar piadas de alívio cômico do que resolver de fato a situação. Juro que eu não me incomodo com a ideia de ingenuidade da coisa toda, mas sim com a artificialidade para se chegar a isso.
Margin Call – O Dia Antes do Fim (Margin Call, EUA, 2011)
Dir: J. C. Chandor


A alta cúpula da empresa é então acionada para discutir a situação e, principalmente, encontrar uma saída o mais rápido possível. O prejuízo, inclusive moral, é inevitável. O grande trunfo do filme é apresentar essa situação de calamidade anunciada sem se mover pelo desespero. A narrativa nunca transparece agitação, as ações dos personagens nunca são precipitadas, embora a situação seja crítica e a apreensão é sentida desde o início. É mais um filme sóbrio, que tenta ainda clarificar um pouco de como se deu a crise econômica (muito embora o economês esteja presente). Assim, faz uma bela dobradinha com o documentário ganhador do Oscar este ano Trabalho Interno. Com um texto preciso e ótimos diálogos, o filme ainda se beneficia de um ótimo elenco, todos em sintonia (destaque para Kevin Spacey que, para além da dureza que deve representar na empresa, revela ainda uma faceta humanista dentro de outro centro dramático que envolve sua cadela à beira da morte). Ela agoniza assim como todo um mercado que estará na mesma situação.
Missão: Impossível – Protocolo Fantasma (Mission: Impossible – Ghost Protocol, EUA, 2011)
Dir: Brad Bird


E é com todo esse gás que a franquia se notabilizou, fazendo do absurdo das situações, das missões e, principalmente, da quase “invencibilidade” dos personagens uma marca própria. Basta somente que o talento de Brad Bird administre essas questões em prol do ritmo da narrativa, para não perder em intensidade. Tom Cruise consegue administrar muito bem sua canastrice a favor de seu personagem, enquanto os coadjuvantes equilibram com outras características. Simon Pegg, o alívio cômico; Paula Patton, a sedutora; Jeremy Renner o durão. E há ainda Léa Seydoux, linda de morrer (e isso não é um trocadilho), fazendo as vezes de femme fatale. E não podia faltar os acordes do tema clássico novamente reinventado, aquele que quando soa nos faz ansiar por boas doses de adrenalina.
Natimorto (Idem, Brasil, 2009)
Dir: Paulo Machline


Ao propor à cantora que passem a viver isolados do mundo num quarto de hotel (ele se diz assexuado e possui um casamento desastroso com uma mulher tenebrosa), acaba se afundando na sua própria paranoia, essa que o filme acompanha com um misto de interesse e distanciamento. Simone Spoladore (que tem feito coisas muito ruins ultimamente, como Elvis e Madona e Insolação) gasta bastante de seu talento para conferir naturalidade ao texto muitas vezes artificial e impostado que recebe. Mas mais despreparado ainda está o próprio Mutarelli, visivelmente desprovido de força dramática, o que tira muito a intensidade de seu personagem. E do próprio filme que cola a esse homem perdido, fadado a se autoconsumir entre cigarros, loucuras e desejos não concretizados.