(Antes tarde do que nunca OU Mais um retorno)
Problemas vários me deixaram fora da blogosfera por um bom tempo, mas sempre ansiamos pelo retorno e já que o assunto é esse, por que não recomeçar as atividades com outra volta? Sim, ele, Dr. Jones. Mas como meu contato com a série Indiana Jones se resumia a algumas cenas exibidas na Sessão da Tarde, me aventurei a fazer uma vistoria dos filmes do Spielberg protagonizados por esse mítico personagem de chapéu e chicote na mão. O bom e velho cinema de entretenimento nunca mais foi o mesmo e parece que não vai voltar a ser tão cedo.
Os Caçadores da Arca Perdida (Raiders of the Lost Ark, EUA, 1981)


Com certeza, ver esse filme hoje não é o mesmo do que presenciar o nascimento de um personagem que provocou uma revolução no cinema de entretenimento quando a década de 80 estava começando. O famoso arqueólogo surge numa aventura em plena América do Sul e logo será levado a procurar a lendária Arca Perdida, onde se acredita conter o que restou da tábua dos Dez Mandamentos. Mas também os nazistas estão atrás da relíquia, e é contra ele que o herói deve lutar (não esquecer que a trama se passa em 1936). O maior mérito do filme é que todos ali envolvidos parecem acreditar de fato naquela aventura, por mais absurda que seja (todo o desenrolar da história e as várias reviravoltas são sempre desenvolvidas de forma inteligente). Acredito que esse seja o maior elogio que um filme de aventura pode receber: não o fato de ser totalmente verossimilhante, mas o fazer acreditar nessa verossimilhança. Aqui, algumas seqüências deixam qualquer um de queixo caído: no início, o assalto ao bar que acaba em chamas, a briga aos pés do bimotor nazista e logo depois a perseguição ao caminhão que está levando a arca. E se o grandioso e inconfundível tema musical criado por John Williams já foi imitado diversas outras vezes, é aqui que ele apareceu pela primeira vez. O coração até bateu mais rápido!
Indiana Jones e o Templo da Perdição (Indiana Jones and the Temple of Doom, EUA, 1984)


Não é difícil imaginar a continuidade de um filme de aventura quando o primeiro da série fez tanto sucesso. Uma pena que, de início,
O Templo da Perdição tenha os defeitos de um caça-níqueis com direito a vilões caricaturais (os chineses no bar), ações descabidas (a fuga do bar) e exploração de culturas exóticas (aqui a chinesa e indiana). A trama se passa um ano antes da aventura do filme anterior quando o Dr. Jones se vê perdido numa aldeia indiana marcada pela miséria, com crianças sendo raptadas e sacrificadas em rituais mágicos, depois que uma pedra sagrada foi roubada do lugar; nem é preciso dizer que sua missão passa a ser o resgate da pedra a fim de salvar a aldeia. Dessa vez, o inimigo são povos tribais antigos e seus rituais de sacrifício. A primeira metade do filme é enfadonha e precisamos suportar a irritante personagem de Kate Capshaw que, na tentativa de trazer alívio cômico ao filme, diminui muito o nível de inteligência dos diálogos. E convenhamos que a tentativa de causar impacto (e náusea) quando são servidos num jantar miolos de macaco, sopa de olhos, enguias vivas e coisas do gênero é extremamente apelativa e desgastante. Mas quando personagens descobrem o templo, a ação começa pra valer, vai até o fim e é adrenalina pura. Então o filme se transforma e o talento de Spielberg para construir cenas de ação, misturadas ao clima de terror macabro, eleva muito o nível do filme. De quebra, essas cenas são engrandecidas por uma excelente fotografia em tons fortes e pesados, bastante adequada à situação. Enfim, nem tudo estava perdido.
Indiana Jones e a Última Cruzada (Indiana Jones and the Last Crusade, EUA, 1989)


Se o segundo episódio pareceu que ia se tornar um desastre e foi salvo em sua metade, infelizmente o mesmo não se pode falar desse terceiro. O filme está sempre tentando levantar vôo, mas nunca consegue, principalmente por conta de um roteiro fraco e cheio de furos. Na nova empreitada, Indy precisa encontrar o Santo Graal (aquele usado por Jesus na Última Ceia) e resgatar o líder de uma expedição que havia começado a busca, líder esse que é justamente seu pai, interpretado por Sean Connery. O diferencial do filme é precisamente a relação familiar entre pai e filho, ao mesmo tempo em que passamos a conhecer um pouca mais da vida íntima de nosso herói. De fato, existe uma ótima química entre Ford e Connery, mas confesso que esperava mais sobre a relação dos dois personagens, que é discutida em alguns momentos, mas sempre acaba em tom cômico, nunca é aprofundada. Talvez essa seja uma cobrança descabida, já que estamos falando de um filme de aventura e não de um drama familiar, mas no fundo me pareceu uma oportunidade perdida, de transformar o filme em algo mais do que somente ação. Essa, inclusive, deixa muito a desejar. O filme não possui um terço do sentido de aventura e adrenalina dos três outros filmes e muitas das cenas de ação soam completamente inverossímeis (o que é aquele avião nazista em chamas passado dentro de um túnel ao lado do carro? E aquele encontro patético de Indy com Hitler? Só não invoco o nome de Cristo porque é uma blasfêmia). Até a música do grande Williams me pareceu mais chocha dessa vez. Uma pena para uma série que começou tão bem.
Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal (Indiana Jones and the Kingdom of the Crystal Skull, EUA, 2008)


19 anos se passaram para que o arqueólogo-herói Indiana Jones nos voltasse em mais uma aventura. Nada contra as continuações mas a bronca em relação ao filme está mais ligada ao fato de a nova aventura não tiver outro propósito do que o lucro da produtora de George Lucas em cima de um personagem mítico. Digo isso porque o novo filme vem em doses cavalares de exagero propiciados por efeitos especiais que não estavam à disposição dos realizadores na década de 80 e que fazem o espírito de aventura dos primeiros filmes da série se perderem em meio a situações improváveis e um roteiro por vezes furado. Durante a Guerra Fria, nosso herói é convencido pelo jovem Mutt Williams (Shia LaBeouf) a procurar a lendária Caveira de Cristal, artefato mítico possuidor de grandes poderes, possivelmente encontrada por um outro arqueólogo amigo de Indy, o Prof. Oxley (um John Hurt totalmente subaproveitado). Logo, ele estará na selva amazônica atrás do objeto e tendo em vista o momento histórico da trama, dessa vez os vilões da história são os russos, personificados pela ambiciosa espiã vivida por Cate Blanchett. O desenvolvimento dos pontos do roteiro deixou há tempos de ser o forte dos filmes de aventura, que prezam mais pela ação despropositada capaz de impressionar pela grandiosidade e não pela veracidade (Exemplos do filme: a explosão nuclear ou a queda dos personagens num carro por três cachoeiras seguidas sem grandes lesões para ninguém). Mesmo assim, há boas surpresas como o reaparecimento da personagem de Karen Allen, que foi o interesse romântico de Indy no primeiro filme, e volta trazendo uma ótima surpresa: a notícia de que ele tem um filho. Daí surgem os momentos mais engraçados do longa. De qualquer forma, dá uma saudade enorme do senso de aventura do primeiro filme, mas no fim das contas, reféns que somos desse tipo de estrutura, vale a diversão e a torcida pelo sucesso dos mocinhos.
PS: A remasterização dos três primeiros filmes abusa demais dos efeitos especiais e acaba por minimizar um tanto o impacto de algumas cenas. Droga!
PPS: Uma característica que eu adoro no Spielberg, e que aparece em todos os filmes dessa série, é a utilização de sombras para causar efeitos vários, que nos remete diretamente à escola expressionista alemã. Maravilhoso!