quinta-feira, 18 de julho de 2013

Cores que passam

Os Amantes Passageiros (Los Amantes Pasajeros, Espanha, 2013)
Dir: Pedro Almodóvar


Se pudermos pensar em Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos como uma espécie de passagem de Almodóvar de uma fase mais escrachada para uma mais madura e dramática, aliada a um apuro estético que foi evoluindo a cada filme (chegando ao ápice, talvez, em Fale com Ela), é muito interessante esse retorno que o diretor espanhol promove com seu novo filme, Os Amantes Passageiros.

O tom escrachado está aqui, só que muito mais despudorado, no filme certamente mais gay do diretor, ele que transita com muita naturalidade e liberdade pelo universo pansexual, acentuado pelo melodrama. Só que agora o cineasta surge com uma mise-en-scène mais elaborada. O roteiro, porém, tem seus altos e baixos (especialmente quando sai do avião, na metade do filme), mas no geral rende algumas boas risadas.

O filme formata-se como comédia rasgada, embora não seja tão hilário como gostaria de ser. As confusões que tomam lugar num voo da companhia Península, indo da Espanha em direção ao México, reúne uma gama de personagens excêntricos, na medida em que nenhum deles parece central nesse mosaico de tramas (que vão cada vez mais se entrecruzando). Tripulantes e passageiros interagem e se expõe quando problemas técnicos no avião apontam para um pouso emergencial.

Como diz o letreiro de abertura, trata-se de “um filme de ficção e fantasia”. Seria essa uma forma do diretor se precaver de críticas mais duras ou entendimentos de uma obra supérflua, caso o nonsense nunca fosse uma marca presente nos filmes do diretor, especialmente nas comédias (e mesmo nos dramas mais sérios, como o filmete O Amante Minguante dentro de Fale com Ela).

Esse recado seria, então, uma forma do cineasta pisar mais fundo no acelerador do escracho, sendo mais explícito, direto, sem papas na língua; uma espécie de autoliberdade imposta. O mote do possível desastre no voo é a oportunidade para que os passageiros revelem (ou são obrigados a entregar), um a um, não só seus segredos sexuais, mas também os dramas amorosos e familiares de alguns. Em meio à comédia, facetas policiais e sobrenaturais surgem para outros, assim como uma cena de número musical que os comissários de bordo ensaiam para acalmar os ânimos de todos.

Enfim, esse misto de atmosferas e possibilidades narrativas poderia desequilibrar o filme. Mas, como uma espécie de síntese de tudo aquilo que Almodóvar já testou em sua obra anterior, há uma segurança em transitar entre cada uma, sem se apegar de fato a elas. No fundo, fica na mente uma obra despretensiosa, sem grandes momentos. Um filme passageiro, mas agradável.

5 comentários:

Amanda Aouad disse...

Uma bobagem divertida, hehe. Realmente nada demais.

Pedro Tavares disse...

Pois logo que saí da sala pensei que Os Amantes Passageiro merecia revisão, não só para assimilação do conteúdo anárquico, mas principalmente pela crítica segura do momento delicado vivido pela Espanha. Ainda não revi, mas pensar sobre ele já me fez gostar um pouco mais.

Abs!

Rafael Carvalho disse...

Por aí, Amanda. Não faz mal a ninguém, só aos mais moralistas.

Pedro, essa coisa do comentário político é muito interessante porque não me parece algo muito intencional do projeto, mas que faz muito sentido no contexto atual. Nesse sentido, acho que vale mesmo uma revisão.

Wallace Andrioli Guedes disse...

Concordo com tudo, Rafael. Menos com a nota (que, no fim das contas, é o menos importante, certo?). Daria 3/5.

Rafael Carvalho disse...

Sim Wallace, o menos importante. Acho que por mais divertido que o filme seja, tem umas fragilidades que o tornam um tanto esquecível.