terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Homens de valor

Bravura Indômita (True Grit, EUA, 2010)
Dir: Joel e Ethan Coen



Ao readaptar para o cinema a mesma história que o diretor Henry Hathaway levou para os telões em 1969, baseado no livro homônimo de Charles Portis, os irmãos Coen realizam um de seus filmes mais clássicos, quadrado mesmo, como parece ser o tom da grande maioria dos longas indicados ao Oscar este ano.

A grande falta do filme é a ausência de uma evidência maior do estilo direto e sem concessões dos irmãos, algo impresso em Onde os Fracos Não Têm Vez, para ficar num exemplo próximo em gênero a seu novo projeto. Daí vem certa decepção para com esse filme, principalmente para quem viu o original e pouca coisa notou de diferente.

O desenrolar da história é o mesmo: a menina de 14 anos Mattie Ross (Hailee Steinfeld) tem o pai assassinado pelo vigarista Tom Chaney (Josh Brolin). Ela decide então contratar o xerife beberrão Reuben "Rooster" Cogburn (Jeff Bridges) para encontrar e acertar as contas com o malfeitor. No meio do caminho descobre que ele também está sendo procurado por LaBoeuf (Matt Damon) pelo assassinato de um senador no Texas.

As comparações inevitáveis com o filme original não deveriam atrapalhar o mais novo projeto caso o filme fosse dotado de um algo mais que pudesse valorizar a história. O máximo que Joel e Ethan Coen fazem é criar um clima mais soturno ao filme, valorizando cenas noturnas, muito propícias a um clima sombrio e pessimista, como parte da visão de mundo dos diretores. (Nesse sentido, a cena final, duríssima, é muito boa e interessante para revelar esse aspecto). Falta vigor na direção.

Mesmo em sua mensagem o filme parece estar preso a uma noção muito simples. Se na obra-prima do western contemporâneo (sim, o gênero não morreu) Onde os Fracos Não Têm Vez os Coen têm muito a dizer sobre a passagem do tempo, a perda de valores por parte da humanidade e o estado gritante de violência a que o mundo chegou, seu mais novo produto fala de como é ainda possível encontrar pessoas valorosas onde menos se espera (o “valor verdadeiro” da tradução do título original do filme).


Do roteiro bem construído e redondinho, destaque para a protagonista Mattie criada como uma jovem independente e de personalidade forte, a despeito de sua pouca idade. Em certo ponto, é a coragem e determinação dela que movem a perseguição. E Hailee Steinfeld faz todo o jus à personagem, numa performance contundente que sempre inspira segurança e destemor, mesmo nas situações mais difíceis para Mattie. Destaque também para Jeff Bridges (no papel que valeu ao mito John Wayne seu único Oscar), taciturno e ranzinza, apesar do bom coração.

Além disso, o filme é fotografado com uma beleza absurda por Roger Deakins, supervalorizando qualquer foco de luz para irradiar as cenas, o que intensifica demais a tensão dramática da narrativa. Num contraponto, a música de Carter Burwell é minimalista, empolgando poucas vezes.

Se Bravura Indômita não é o melhor a que os Coen podem chegar, também não deixa de ser um bom produto dentro de um gênero já pouco praticado, mas que ainda resiste bravamente ao tempo, diferente dos valores que os bons homens do velho oeste propunham em propagar.

5 comentários:

ANTONIO NAHUD disse...

O melhor do filme é a fotografia de Roger Deakins. Mas não se podia fazer nada, o primeiro filme já era bem sofrível.
Abraços

www.ofalcaomaltes.blogspot.com

Wallace Andrioli Guedes disse...

Olha, eu vi o filme no computador, numa cópia não lá muito boa, e a impressão que fiquei é que é uma pequena obra-prima. Não gosto da versão com o Wayne, e acho que, por mais que os Coen sigam a mesma história, o filme é completamente diferente no clima, como você mesmo chegou a pontuar. A questão é que isso muda sim um filme, determina seus sentidos e intenções. A visão sombria, melancólica, passada pelos Coen eleva BRAVURA INDÔMITA a um western de beleza gigantesca, tornando a relação entre o trio de protagonista algo lindo e singelo. Espero rever no cinema, para confirmar (ou não) essa minha primeira impressão.

Cristiano Contreiras disse...

Interessante esse filme, eu confesso que deixei pra ver no telão – mas, não esperava que fosse gostar tanto. Sim, gostei bastante!

Na verdade, grande parte, ao meu ver, do fascínio que esse filme exala é por conta da inspirada atuação de Hailee Steinfeld. Um absurdo a Academia indicá-la como coadjuvante, visto que seu personagem tem função de Atriz principal, sabemos disso. Mas, enfim, ela que merece o Oscar, e não Melissa Leo. Mas, duvido que seja vencedora…de qualquer forma, vai ser mais indicada, tem tudo pra crescer. A menina nos hipnotiza em cena.

De fato, eu já havia dito isso até no meu twitter, Jeff Bridges está soberbo e muito melhor que Colin Firth por “O Discurso do Rei” (ok, não desmereço nenhum dos concorrentes, pois a categoria está forte esse ano), mas sejamos sincero: seu papel aqui é mais denso e complexo que o do “Coração Louco”, hein? Mas, não será premiado não. Ainda assim, é uma personificação marcante! E concordo com a maioria, ele está melhor que John Wayne do filme original. Na realidade, eu nem gosto do filme original. E nem vejo esse como um remake, mas é.

Josh Brolin, mesmo que em tão pouco tempo em cena, consegue mostrar que é um ator mais maduro. Gostei de Damon também, mas o filme é de Hailee e Brigdes!

ABS

Stella disse...

Será que Roger Deakins não é simpático? Mostrando o que é capaz em Fargo, Onde os Fracos não tem Vez, Duvida, A Vila, Uma Mente Brilhante, O Assassinato de Jesse James... etc, como é possível não ter sido eleito por seus pares para o Oscar? Ainda bem que o ingleses foram mais justos e lhe deram 2 BAFTA.

Rafael Carvalho disse...

Oh Antonio, que maldade. Acho o primeiro filme tão bom quanto esse. O do Hathaway é mais amarrado, o dos Coen é mais sombrio. Mas gosto de ambos, cada qual tem alguns momentos melhores que o outro. A fotografia, realmente, é deslumbrante!

Ok Wallace, mas acho que essa relação que se constroi entre os personagens está presente em ambos os filmes, a mudança de tom não modifica essa relação, pode torná-la um pouco diferente. Particularmente, gosto de ambos os longas. E na tela de cinema o filme é deslumbrante, principalmente em se tratando de uma fotografia tão sensacional quanto a do Deakins.

Cristiano, acho que existe uma química bem boa entre a Hailee e o Bridges, ambos ótimos no filme (embora eu ache que a Leo mereça esse Oscar, apesar do destempero dela. E, realmente, o Bridges merece mais que o Firth). Em relação ao filme anterior, gosto dele na mesma medida que desse.

Stella, o cara tem mesmo um currículo de dar inveja, mas a gente sabe que não é só isso que se precisa para ganhar um Oscar. De qualquer forma, é um deleite ver o filme no cinema.